1509725595914942

29 de out. de 2014

Os Fundamentos da Religião

Por Herman Bavinck

O significado da Religião cristã pode ser determinado a partir da disputada etimologia da palavra “religião”. A Bíblia não dá uma ideia geral de religião, mas apresenta a revelação de Deus de forma pactual como seu objetivo e o temor do Senhor como lado subjetivo. Deus deve ser honrado e sua revelação deve ser crida e obedecida. A religião bíblica é, em primeiro lugar, um assunto do coração: ela nunca é esgotada pela observação.

De acordo com Tomás de Aquino, a religião não é uma questão de virtudes teológicas (fé, esperança, caridade), que têm Deus como seu objeto direto, mas de virtudes morais (prudência, justiça, firmeza e temperança), das quais Deus é o fim. O real objeto da religião aqui é a devoção obedientemente oferecida a Deus. A religião pertence à virtude da justiça, é a virtude pela qual os seres humanos oferecem a Deus a devoção e a adoração a Ele devidas.

Os teólogos reformados distinguem mais claramente a piedade como o princípio e a adoração como o ato da religião. A piedade é, antes de tudo, um estado de existência, um hábito e uma disposição que levam os seres humanos a adorar a Deus. Schleiermacher até mesmo definiu a religião em termos de piedade, como “sentimento absoluto de dependência”. Embora essa definição seja inadequada, ela também contém elementos de verdade. Nós, criaturas humanas, somos radicalmente dependentes de Deus. Subjetivamente, isso é conhecido como fé, a fé que nos leva ao serviço, a atos de obediência e ao amor. A verdadeira religião consiste na confiança absoluta em Deus e em um sincero desejo de viver em obediência a Ele.

A era moderna deus origem a um estudo comparativo cientifico, histórico ou psicológico de todas as religiões. Embora todas as religiões tenham similaridades  formais (revelação, culto, dogma), não existe uma religião genérica, apenas religiões concretas, todas com alegações conflitantes. Os esforços para se chegar a essência da religião em geral levaram a resultados magros com proposições vagas, e a pesquisa deve ser considerada um impasse. Não há como escapar da necessidade de julgar o conteúdo de religiões especificas como “verdadeiro” ou “falso”. Os juízos dogmáticos não podem ser evitados.

Antropologicamente, qual é o lugar da religião na psique humana? A religião é primariamente conhecimento, moralidade ou sentimento? Grande parte do pensamento moderno, notavelmente o idealismo, tem uma interpretação intelectualista da religião. Para Hegel, todo o mundo é um desdobramento da mente. A religião é uma forma de conhecimento substituído somente pela filosofia. A tradição kantiana, contudo, define a religião voluntaristamente como conduta moral e localiza e localiza sua sede na vontade humana. Outros, como Schleiermacher, influenciados pelo romantismo, consideram a religião como primariamente estética e localizada no sentimento humano. Embora intelecto, moralidade e sentimento desempenhem papéis importantes na verdadeira religião, ela não deve ser reduzida a uma só faculdade. A verdadeira religião é central para todos os atos culturais e produtos humanos: ciência, moralidade e arte.

Cientificamente, tentativas históricas para explicar a origem da religião não dão certo. Nem o temor, nem a ilusão sacerdotal, nem a fraqueza humana, nem a busca da felicidade, nem a ignorância é uma explicação satisfatória. Tentativas de considerar a religião como uma “auto-afirmação da vida do Espírito” fazem com que Deus e a religião sejam uma criação humana, inventada para satisfazer a necessidade humana, Deus é um servo da humanidade.

Finalmente, o estudo científico, histórico, das religiões não pode encontrar resposta  para a origem da religião – somente a revelação pode fazer isso. A religião não pode ser entendida sem Deus e, para que possamos conhecê-lo, ele tem de se revelar a nós. A revelação é o princípio externo do conhecimento da religião. A revelação e a religião não são estranhas à natureza humana. Em vez disso, como portadores da imagem de Deus, os seres humanos são, por natureza, religiosos. Portanto, a religião é uma realidade universal. Somos criados por Deus. A religião existe porque Deus é Deus e quer ser honrado. Para esse fim ele se revela a nós e faz com que sejamos subjetivamente aptos a conhecê-lo.

Fonte: Dogmática Reformada – Vol. 1, cap.8, p.235,236